sábado, maio 28, 2005

Game Over.

Estou feliz. Estou feliz por finalmente pôr um fim a este blogue.
Quero agradecer a toda a gente que veio a este blogue e que o comentou ou simplesmente ficou a ler.
Fico contente se por alguma vez vos fiz pensar sobre algo, ou algum dos meus textos vos tocou de alguma forma particular. Se o fiz foi puramente intencional e significa que há por aí gente que pensa, age e sente as coisas como nós. O que é bom.
Como tudo tem um fim, também este blogue chegou ao seu fim. Bem sei que várias vezes disse o mesmo e mais tarde voltei, porém, desta vez é definitivo.
Preciso de me regenerar.
Obrigado a todos aqueles que deixaram comentários. Agradecer também àqueles aquando da minha retirada vinham ao blogue ver se eu tinha regressado ao activo. Desta vez escusam de vir que eu não voltarei.
Quero agradecer às seguintes pessoas que foram as primeiras a ler o meu espaço e a comentá-lo dia-a-dia, semana a semana: Sara, Helena, Lana, Sérgio ( Já desististe do teu? Homem q é homem continua o seu blogue :P ), André (seu blogwhore), Cláudia & Shadow. Em particular à Sara, e à Helena pelos mails que me enviaram. Acho que não me esqueci de mais ninguém.
Não voltarei a escrever nem a comentar nenhum blogue, mas continuarei, obviamente, a ler os vossos cantinhos. Faz um teu Sara :P
Se alguém quiser usar um qualquer dos textos neste blogue está à vontade. Faça só referência de onde ele veio, obrigado.
Como diz a letra de uma música do grupo britânico Mansun: 'We Must Say Goodbye To You'.

Vemo-nos por aí, com outro nome, outro lugar, a mesma essência ou diferente. Tempo dirá.
Inté.

PS: Obrigado por teres existido num determinado tempo. Fizeste-me mudar. I hope & Think.

http://morreste-me.blogspot.com , 2004/2005

Problemática das Relações na Era Moderna.

[Os temas maioritários deste blogue são o amor, mas acima de tudo as relações humanas. É disso de que eu gosto de falar. Bem ou mal, não sei, mas sei de que gosto e é isso de que eu me sinto bem a falar. Este texto é uma espécie de 'mix' entre tudo o que está mais ou menos perdido neste blogue e aquilo que nunca disse]


As realidades mudam muito ao longo dos anos. Mudam tanto que às vezes torna-se difícil acompanhar as mudanças existentes no seio do tecido social.
A industrialização acabou por marcar uma nova etapa deste nosso mundo. As realidades sociais jamais seriam as mesmas.
A vida tornou-se mais rápida e todos nós vivemos de uma forma, ou outra, sempre a correr. Cada vez temos menos tempo para dedicar àquilo de que realmente gostamos, e acima de tudo, temos cada vez menos tempo para dedicar a quem gostamos. O pouco tempo que temos dedicamos à inércia ou a dormir para descansar da correria que a sociedade de hoje em dia nos obriga a viver.
Não só a sociedade tornou-se mais rápida como também novas formas de pressão afectam os indivíduos. Sentimos a pressão todos os dias, ao longo da nossa vida hoje em dia. Se tal realidade antes da industrialização era rara, hoje em dia tal facto não se pode dizer. Todos os dias, desde que nascemos, somos pressionados para atingir demasiados objectivos. Temos que atingir realidade X até à idade Y de maneira Z. É mais que óbvio que no decurso da nossa vida não conseguiremos atingir alguns desses objectivos que nos são impingidos pela realidade. Acabamos por nos sentir profundamente frustrados por não atingir alguns desses objectivos. A frustração pode resultar da nossa simples consciencialização de não ter conseguido atingir o objectivo em questão, ou então da simples comparação com outras pessoas que rodeiam a nossa vida. O saber que a pessoa X que tem a nossa idade já atingiu Y e que nós ainda nem lá chegámos, nem sabemos quando iremos lá chegar, basta para nos sentirmos mal, e nessa medida frustrados.

A pressão social faz-se sentir também a nível das nossas relações no dia-a-dia.
Somos todos os dias bombardeados de imagens estandardizadas de como ser perfeito, ter uma relação perfeita e viver um amor feliz para o resto da vida. A típica imagem dos filmes americanos. Estudar, ter um bom emprego, casar, ter dois filhos, um cão e viver numa casa grande. Contudo, esta realidade está cada vez mais a mudar. Não só as pessoas cada vez menos se casam como a típica imagem do casal perfeito deixa de existir hoje em dia, com as uniões de facto, etc.

A maneira como vivemos a correr a nossa vida, e o nosso dia-a-dia, deixa-nos pouco tempo para conhecer quem nos rodeia, ou pouco tempo para conhecer pessoas novas.
Nessa medida as pessoas procuram coisas, ou realidades, que permitam efeitos mais ou menos imediatos – Fast Happiness.
O crescente aumento de relações descartáveis como remendos para as carências ou falhas emocionais é algo profundamente sintomático da realidade hoje em dia. Não quer dizer que isso seja mau, longe disso, acho simplesmente que é algo mau fazer dessas relações a base do nosso dia-a-dia.
As pessoas procuram estabelecer uma relação simbiótica com alguém através dessas relações, quando na realidade as relações simbióticas não nascem de algo 'fast'. É algo construído ao longo do tempo. O construir as nossas relações única e exclusivamente na base 'descartável' pode levar a profundas frustrações emocionais. As pessoas andam a tapar as suas feridas e carências com pensos rápidos. Isto pode levar a que as pessoas acabem por cair numa espécie de ciclo vicioso. Sempre à procura da próxima relação descartável e que ela traga a felicidade no seu interior. Algo que eu duvido que possa acontecer, mas não impossível.

O estabelecer uma relação de simbiose com alguém, isto é, estabelecer uma relação de profunda empatia com alguém, é algo que é construído ao longo do tempo. Pode sempre haver um 'click' entre dois seres que se conhecem de uma forma mais ou menos fugaz, claro que sim, porém, normalmente esse 'click' tem que ser trabalhado ao longo do tempo para que se possa conhecer a pessoa profundamente e se estabeleça uma forte ligação entre ela e nós. Uma relação de simbiose entre dois seres, onde um conhece perfeitamente o outro e vice-versa.
Uma relação simbiótica é então fruto de uma construção entre dois seres ao longo do tempo, sobretudo sem pressa em querer atingir o seu estado final, digamos assim.
O facto de se ter tido várias relações no passado, descartáveis, ou não, pode ser importante para criar esta relação simbiótica entre dois seres. Deste ponto de vista acho então que se pode dar alguma importância às relações fugazes.
O experienciar de múltiplos estilhaços emocionais em relações vividas outrora pode proporcionar uma maior ligação entre duas pessoas, e acima de tudo, proporcionar uma maior experiência de como aproveitar os momentos fugazes, ou não, de felicidade. Ambas as pessoas devido às suas experiências anteriores, conhecem bastante bem o lado do fracasso emocional, nessa medida saberão aproveitar toda a experiência acumulada para potencializar a relação presente. Aliás, sou da opinião de que duas pessoas que tenham passado por múltiplos episódios de amores fragmentados ou estilhaçados conseguirão aproveitar de forma muito melhor o amor. Ambas conhecem bastante bem o lado negativo, e nessa medida irão aproveitar ao máximo todos os fragmentos de felicidade existentes no presente.

Uma coisa que sempre me fez confusão foi o facto de eu problematizar tanto a minha vida. Acho que tenho de uma forma ou outra a perfeita consciencialização de como as coisas acontecem a nível das relações (modéstia à parte). Nessa medida estou sempre a teorizar a realidade e tudo aquilo que os meus olhos vêem no dia-a-dia. Já o contrário me faz confusão. Faz-me confusão a maneira como as pessoas vivem a sua vida de forma tão igual e estandardizada. Há pessoas que fazem a vida toda sem problematizar ou teorizar nada em relação às suas vidas. Limitam-se a vive-la de forma tão igual a toda a gente. Não que isso seja mau, às vezes também gostava de ser assim, mas realmente não consigo.
Isso pode levar a pessoas como eu, que se sintam 'anormais', a tentar levar uma vida normal, como todos os outros. Ser mais um, como os "outros".
Esta ideia de se tentar ser como os outros leva a uma total aniquilação do meu interior e a uma consequentemente perca do meu interior. Estarei a agir como os outros, serei apenas mais um, serei vitima, por vontade própria, da estandardização emocional / relacional.
A vontade e o agir querendo ser como os outros, e acima de tudo a consciencialização de ver o meu Eu a ser absorto pela maioria instituída e o compreender que estou a ser simplesmente mais um, pode levar a sentimentos de culpa. A longo prazo inclusive a sentimentos de frustração enormes numa luta entre ser Eu ou tentar ser Igual.
No caso de pessoas mais fracas, ou com maior 'background' de experiências frustradas de aniquilar o seu Eu interior pode levar até ao suicídio.
Resumindo: Ser EU é uma Merda. Gostava de ser como Vocês mas não consigo.

Alma Mutilada

Estás tão longe... Tão longe de mim, meu amor.
Passas os dias no quarto, sentada em cima da cama com o olhar triste, lacrimejante, a olhar para fotografias de quando eras mais nova.
Às vezes tenho vontade de ir ter contigo e de te tirar daí. Mas até eu já nao tenho forças para tal. No principio, no principio não era assim. Bem me lembro de como te conheci.
Frequentávamos os mesmos locais, os mesmos corredores, as mesmas salas, mas sempre em tempos e horas diferentes. Na correria obstinada do dia-a-dia passávamos quase um pelo outro e nem reparávamos na alma de cada um de nós. Até um dia.
Lembro-me perfeitamente do dia em que o tempo e porventura o destino nos fez olhar um para o outro. Naquele corredor, naquele local áspero, frio e pouco luminoso, os meus olhos repararam na tua presença. Os teus cabelos ruivos desde logo te diferenciavam das outras - aliás, sempre foste e serás diferente das outras. Os meus olhos colaram em ti. Tu retribuis, e como se o tempo tivesse parado naquele instante senti que nada mais havia à nossa volta. Todo o movimento inerente àquele local parecia ter desaparecido subitamente. Éramos só nós os dois. Meus olhos penetravam nos teus e assim ficámos segundos que pareceram uma vida - uma vida em que eu andei sempre à procura dos teus e tu dos meus. Algures no meu estado catatónico pessoas chamam-me, eu olho para o lado, vejo quem me chama. Volto rapidamente a olhar para onde estavas, porém, já tinhas desaparecido.
Dias depois num convivo boémio qualquer vi-te de novo. Avancei e metemos conversa. Não sabia o que dizer e havia entre nós uma série de silêncios ensurdecedores. Pegas na minha mão e levas-me para o jardim que rodeava o recinto. A tua pele branca, macia e doce, fazia-me desejar querer ficar em contacto contigo o resto da minha vida.
Falámos, falámos e falámos até perdermos a noção das horas. De repente era já um novo dia.
Tempo avançou. Tempos depois tínhamos uma relação. Acabámos o curso, arranjámos emprego, comprámos uma casa e casámos. Estávamos a viver a nossa história de amor e assim foi durante seis anos. Depois tivemos o Pedro, nosso filho, e subitamente afastaste-te de mim...
Concentrávamos toda a nossa atenção no Pedro que acabámos por deixar que a nossa relação tivesse a falecer aos poucos.
Eu, preocupado com vocês, trabalhava horas e horas a fio, para vos poder proporcionar tudo o que era necessário, assim pensava eu, porém, esqueci-me de vos dar tempo comigo mesmo, para poderem estar comigo e podermos estar todos juntos.
Acabei por perder a vida do Pedro. Enclausurado no trabalho ele cresceu só contigo, e tu a viver só com ele. Chegava de madrugada e partia de manhã cedo, quando todos dormiam. Pensava que eram felizes, mas esqueci-me de que vocês precisavam era de mim e não daquilo que eu trazia para casa.
Quando estava em casa, coisa rara confesso, o Pedro raramente saía do quarto, tal como tu. Pedro raramente falava comigo e vivia no quarto. Às vezes pensava o porquê de a casa estar tão vazia com vocês os dois a viverem o dia-a-dia nos respectivos quartos. Depois compreendi que algures no percurso da minha vida eu tinha ficado sem vida, e acima de tudo, já não existia, ou nunca tinha existido na vida de ambos.
Dava contigo a chorar no quarto olhando para as fotografias de quando eras nova, de quando eras feliz. Pensei várias vezes que se calhar no decurso da tua vida tivesses desejado nunca ter encontrado os meus olhos naquele corredor.
Eu sabia por que choravas, sabia perfeitamente, porém, nunca te perguntei com medo de ver confirmadas as minhas ideias.
E assim continuámos a nossa existência. Até ao fim, até ao fim de tudo. Seremos sempre três, três seres no mesmo tecto, na mesma casa, todos unidos e todos separados. Estranha forma de viver.
Seremos sempre três, três almas mutiladas pela vida e o destino.

terça-feira, maio 24, 2005

O Nó.

É incrível a quantidade de pessoas que andam e passam pela nossa vida sem que a gente lhes diga o quanto elas de facto significam para nós. É incrível a quantidade de tempo que passamos com as pessoas sem nunca lhes dizer o quanto gostamos delas.
Nós sabemos, e às vezes até o queremos dizer, porém, vamos adiando sempre a revelação do quanto elas são importantes para nós. Deixamos para amanhã. Temos vergonha de expressar os nossos sinceros e mais profundos sentimentos em relação a alguém ou então, na correria do dia-a-dia, nem ligamos à importância que essas mesmas pessoas têm para nós. Acabamos por subvalorizá-las. E depois, e depois a fragilidade da vida dá sinais de si e vemo-nos sem essas mesmas pessoas, de uma forma momentânea ou eterna. Aí pensamos. Pensamos que poderíamos ter dito muito mais do que alguma vez dissemos, e de que poderíamos ter aproveitado muito mais daquilo que tivemos.
A vida passa tão rápido, e às vezes só é preciso querer para que ela pare um momento, um momento vital para que se prolongue na eternidade do nosso Eu.
Fica sempre tanto para dizer.

Eu ( ainda ) gosto de ti.

segunda-feira, maio 23, 2005

C.C. #4

'It would be nice to think that since I was 14, times have changed. Relationships have become more sophisticated. Females less cruel. Skins thicker. Instincts more developed. But there seems to be an element of that afternoon in everything that's happened to me since. All my romantic stories are a scrambled version of that first one.' - John Cusack, Rob Gordon, High Fidelity, 2000

Ausência.

'Passaste a vida a falar-me de amor. Mas tu nunca soubeste amar.
Brincavas com as palavras e mentias com elas vidas inteiras como se nada mais existisse. Mas tu não conseguias sentir o que dizias.
Mentias vidas sem fim. Mentias até acreditares no que dizias. E eu acreditei contigo e dei-te a minha vida como se todos os momentos fossem perfeitos. E esperei.
Esperei estações atrás de estações até a minha espera perder-se nos anos que se esfumaram. E depois partiste.' - Geadas, Carlos (2004), 'Esta Ausência', Os Dias de Um Homem Banal, Coolbooks.

Benfica.

"É por não gostar de futebol que sou do Benfica. Tal como compreendo como é que há portugueses que conseguem ser de outros clubes.
O Sporting, o Porto podem jogar bem e o Belenenses e a Académica podem calhar bem em sociedade, mas só o Benfica, como o próprio nome indica, é o próprio Bem. Que fica.
Só o Benfica pode jogar mal sem que daí lhe advenha algum mal. Basta olhar para os jogadores para ver que sabem que são os maiores, que não precisam de esforçar-se muito, porque são intrínseca e moralmente a maior equipa do mundo inteiro. Porquê? Ninguém sabe. Mas sente-se. Quando perdem, não se indignam, não desesperam.
Eusébio só chorou quando jogou por Portugal.
Quem joga no Benfica tem o privilégio e o condão de estar sempre a sorrir.
Não conseguem resistir.

O Benfica, a bom ver, nem sequer é uma equipa de futebol. É um nome.
É como dizem os brasileiros, uma "griffe". Têm uma cor. Antes de entrar em campo, já têm um mito em jogo, já estão a ganhar por 3-0, graças só à reputação. Quando o Benfica perde, parece sempre que quis perder.
Essa é a força inigualável do Sport Lisboa e Benfica - faz sempre o que lhe apetece. O problema é que lhe apetece frequentemente, perder.
Qual é o segredo do Benfica? São os benfiquistas. São do Benfica como são filhos de quem são.
Ninguém "escolhe" o Benfica, como ninguém escolhe a Mãe ou o Pai.
Em geral, aliás, os benfiquistas odeiam o Benfica e lamentam-no no estádio e em casa, mas pertencem-lhe. Quanto mais pertencemos a uma entidade superior, seja a Família, a Pátria, Deus - ou o Benfica, mais direito, temos de criticá-la e blasfesmá-la. Não há alternativa.

Em contrapartida, os sportinguistas e portistas parecem genuinamente convencidos que apoiam as equipas deles porque são as mais dignas ou as melhores. Desgraçados! Se fossem coerentes, seriam todos adeptos do REAL MADRID, AC MILAN, etc, etc.

No Benfica, não se exige qualquer lealdade. Só se pede, em relação aos adeptos de outros clubes, caridade e comiseração.
O Sporting, por exemplo, tem a mania e a pretensão de ser "rival" do Benfica, um pouco como o PSN se julga crítico parlamentar do PSD.
Mas, se se tirasse o Benfica ao Sporting, o Sporting deixaria de existir.
O Benfica é um grande clube porque tem história e talento suficientes para não dar importância aos resultados. Tem uma tradição de "nonchalance" e de pura indiferença que não tem igual nos grandes clubes europeus.
O Benfica não joga - digna-se jogar.
Não joga para vencer - vence por jogar.

Odeio futebol.
Mas amo o Benfica.
As opiniões de quem gosta de futebol são suspeitas.
Claro que os sábios são do Benfica. Mas a força deste grande clube está nos milhões que são benfiquistas apesar do Benfica, apesar do futebol, e apesar deles próprios. Em contrapartida, aposto que a totalidade de pessoas que são do Sporting ou do Porto, por infortúnio pessoal ou deficiência psicológica, são sócios. A força do Benfica, meus amigos, está em quem não paga as quotas, que não vai a jogos, quem não sabe o nome dos avançados - isto é, no resto do mundo.

O Benfica, é o Benfica.
E o que tem de ser - e é - tem muita força."

Miguel Esteves Cardoso

sábado, maio 14, 2005

Fast Happiness.

Há uns dias atrás dias vivi uma situação curiosa.

Eu ía na rua acompanhado de uma amiga. Sabendo eu que ela normalmente traz consigo rebuçados de mentol, flocos de neve, hals e similares, pedi-lhe um, como normalmente lhe peço ou ela me oferece. Nesse dia ela disse que não tinha. Na mala dela, segundo ela, só tinha Prozac. A principio pensei que fosse uma brincadeira, sabendo ela da minha parafilia por tal medicamento, porém, na realidade ela não tinha de facto rebuçado algum e tinha isso sim, Prozac. Aliás, não era só Prozac, era também Xanax, Valium, alguns analgésicos como Ben-u-Rons e mais alguns medicamentos. A mala dela era uma mini-secção de ansiolíticos e antidepressivos de uma farmácia.
Lá me explicou o porquê de andar assim medicada e carregada.
Há uns tempos lembro-me de ter visto na TV que Portugal era o país da Europa que mais consumia antidepressivos e calmantes. Há tempos vi um outro estudo que dizia que cerca de 18 a 20 milhões de Americanos tinha problemas de depressão. 20 Milhões é um numero verdadeiramente assustador. Estados Unidos têm cerca de 250 milhões de habitantes, ok, não parece muito 20 Milhões, porém, 20 Milhões é cerca de duas vezes o número de habitantes de Portugal, no fundo, poderíamos fazer um país só de pessoas com problemas depressivos.
Há claramente um problema na sociedade de hoje em dia. Obviamente que há também um excesso de prescrição de tais medicamentos por parte dos médicos, psiquiatras, psicólogos e afins. Obviamente que há pessoas com enormes problemas na vida, traumas, doentes bipolares, distímicos e afins, porém, há também pessoas que têm apenas crises de melancolia, que por alguma razão ou outra nunca tinham sentido na vida, e logo que as têm vão a correr para o médico pedindo que ele lhes cure os sintomas anómalos nas suas personalidades até então. Os médicos vêem-se então na 'obrigação' de curar rapidamente os seus pacientes. Tome lá um Prozac, Valium, ou uma pílula Violeta ( Xanax ). Na realidade, muitos destes problemas não deveriam ser tratados desta forma, até porque, muitas destas pessoas não têm necessidade de facto de tomar estes medicamentos. Precisam, isso sim, é de férias, falar ou afins, nada de medicamentos. O acto de serem medicados para curar 'melancolia' só faz com que estes se estejam a enganar a eles próprios e se estejam a agarrar a uma 'coisa' quando na realidade a solução era e é muito mais fácil.
As pessoas vivem numa correria no dia-a-dia e nessa medida querem que tudo se concretize a correr, até as suas curas.

Faz este mês, 29 de Maio, três anos que uma pessoa conhecida, na altura amiga, se tentou suicidar. Felizmente não conseguiu perpetuar o seu desejo, mas irá sempre se lembrar do dia em que tentou findar a sua existência. No corpo ficou com as marcas, cicatrizes e ferros nos ossos. Na mente ficou pior do que o estado em que estava antes. E, se a vida era má até então, a partir daquele dia teria que viver com o estigma de ter sido alguém que quis morrer, tentou e não conseguiu. Quase que ficava paraplégica. Felizmente escapou.
Lembro-me perfeitamente dos dias antes dela ter consumado tal acto. A troca de mensagens e de conversas que eu tive com ela tentando aliviar ou fazendo-a ver que o seu desespero não tinha razão. Eu estava com 18 e ela cerca de 16 a cair para os 17 nesse ano, senão me engano. Ela tinha uma história complicada, aliás, tal como todas as miúdas com quem eu me deixo envolver, é a minha sina. Uma série de más experiências amorosas, principalmente uma que tinha tido um fim mais ou menos trágico e dramático, tinham-lhe dado cabo da cabeça e da vida até então. O desespero por não ver a luz ao fundo do túnel, e acima de tudo, o desespero por não querer esperar por ver o que estava lá ao fundo, e o que o tempo reservava, fez com que ela tivesse aquela atitude para com ela mesma.
Por uma série de razões diversas, um tempo de depois cortámos relações. Acabei por lhe perder o rasto. Se bem que sempre que posso vou tentando saber noticias dela, aliás, tal como faço com quem passa pela minha vida. Nunca mais a vi. Às vezes tenho vontade de a encontrar no caminho e de ver como ela está hoje em dia.
Há um espaço entre, sei lá, entre os 13 até aos 18, dependendo das pessoas, uma fase em que se pensa que a vida acaba ali e para além daquilo não há nada mais. Pensa-se que por não se ser amada/o naquele momento, fase, vai-se ficar assim o resto da vida. Não há paciência para esperar pela vida e ver o que de facto ela nos reserva. Ela estava assim, sem paciência para esperar pelo destino.
A vida às vezes é lenta no ajuste das coisas. Há que saber esperar também. Infelizmente há sempre as pessoas mais dramáticas e mais apressadas que querem tudo mais rápido e sempre a correr.

A maior parte das pessoas tem traumas, fragmentos, estilhaços vários no seio das suas personalidades. Todos nós temos os nossos pequenos problemas e traumas, todos nós temos as nossas frustrações. Como dizia Freud, todos nós somos neuróticos. Há que viver com isso mesmo. A vida não é fácil, não, não o é. Nem todos nós vamos poder casar, ter três filhos, uma casa grande, um cão e iremos viver felizes para sempre. Isso são realidade utópicas e apenas uma pequena parte das pessoas têm oportunidade de viver de facto assim. Contudo, temos sempre que ter calma e paciência para ver o que a vida nos reserva. As realidades nem sempre são constantes, e acima de tudo há que fazer algo para as mudar. Quem fica catatónico a olhar para a realidade que tem, é óbvio que ela não vai mudar. Há que fazer algo, algo por nós.
A maior parte das pessoas que conheço não gostam da vida que têm. Eu também não gosto da minha. Poderíamos ter sempre uma melhor, porém, ela também poderia ser bem pior do que é neste momento.
A maior parte das pessoas com que lido no meu dia-a-dia tem algo contra o sexo oposto. Más experiências e nessa medida acabam por estandardizar aquilo que vêem e aquilo que viveram a toda a realidade.
A frustração é algo sintomática da realidade hoje em dia. Isso e o facto de que cada vez mais andamos agarrados a comprimidos quando na realidade a solução por vezes, mas nem sempre, passa por nós mesmos, faz-me pensar que estamos alicerçar toda a nossa sociedade sobre uma bomba relógio. Só falta alguém acender o rastilho.

sexta-feira, maio 13, 2005

Remorsos Fáceis.

Às vezes, às vezes dou por mim mergulhado numa vontade de pegar no telefone, na impossibilidade de o fazer frente a frente, e pedir desculpa a todas as pessoas a quem propositadamente ou intencionalmente fiz mal na vida. Não foram muitas, não, mas foram as suficientes para ter este desejo e para me lembrar delas.
Fico com vontade inclusive de pedir desculpa às pessoas a quem nunca fiz mal nenhum, mas foram elas que me fizeram. Como se o mal que elas me fizeram tivesse tido origem numa falha minha de comunicação ou de não me ter dado como deve ser com essas mesmas pessoas. Essas sim, já não foram poucas.
Dou por mim às vezes a recordar e a ter saudades de pessoas que provavelmente nunca se irão lembrar de mim nem da minha passagem fugaz, ou não, pelas suas vidas.
O desejo de me pacificar com todos aqueles que percorreram a minha vida acaba como qualquer outro. Fico com a ideia durante o dia. Deito-me a pensar nela e adormeço. De manhã já nem me recordo dela. Até uma próxima vez.

domingo, maio 01, 2005

Tudo o Que Podia Ter Sido e Não o Fui.

Olá. Sejam bem-vindos à minha vida.

Quando morrer não deixarei grande legado ao mundo.
Da minha vida não há fotografias. Sempre detestei tirar fotos de mim mesmo, ou de situações em que estivesse envolvido. Achei sempre que conseguiria com que os meus olhos e a minha memória armazenassem a melhor imagem dos momentos que vivi, mesmo que esses fossem maus. Nada seria tão mau se tivesse apenas uma lembrança dúbia ao invés da prova fotográfica.
Da minha vida não há filmagens. Nunca gostei de ser filmado.
Da minha vida não há registos da minha voz. Nunca gostei de ouvir a minha voz. Nessa medida, nunca gostei muito de ser filmado, assim nunca seria captada a minha imagem e consequentemente a minha voz.
Da minha vida não vai restar nada a não ser alguns escritos. E, mesmo esses irão ser esquecidos, ou com o tempo irão estilhaçar-se, fragmentar-se, deteriorar-se e deixar também eles de existir, confinando assim a minha existência no mundo, e na vida, ao nada.
Nunca pedi muito à vida, mas também ela pouco me deu. Limitei-me a passar pela vida de uma forma leve e rápida, sempre a correr, a correr até aqui, até hoje, este momento, presente.
Não me posso queixar. Como, bebo, tenho roupa lavada e tomo banho a horas.
Hoje tenho 70 anos e estou num lar. Como eu estão cá muitos, cada um com o seu motivo ou razão. Uns porque não têm dinheiro e não se podem manter lá fora, outros porque se tornaram num fardo para os familiares, e outros há que estão cá porque não podem ficar sem vigilância. Cada um com seu motivo, cada um com a sua historia.
Eu também cá estou, não por estar doente, não me conseguir manter ou por ser um fardo. Não. Estou aqui porque não tenho nada lá fora e nada lá fora me mantém preso. Vim para aqui preencher o meu tempo. Dá-lo a alguém. É preciso chegar a velho para ter tempo e poder usufrui-lo. Eu tenho tempo e nessa medida aproveito-o para dedicar a outros velhos tão diferentes e iguais a mim. Cada um deles com seus defeitos e suas virtudes.
Na sala principal há um cheiro incómodo. Cheira a velhice e o que vemos é um amontoado de seres com encontro marcado com o destino. Tento conversar com alguns, tendo aprender algo com estes velhos. Alguns deles são verdadeiramente chatos, outros porém, são extremamente interessantes. Lá fora somos todos diferentes, características concomitantes da realidade, cá dentro somos todos iguais.
Para as enfermeiras e auxiliares somos mais uns. Senhora X, Senhor Y, remédio B, comida C. Alguns deles têm um ar extremamente cansado e também eles me parecem velhos. Não admira, trabalhar com idosos é complicado, às vezes somos piores que crianças. Correm do trabalho para casa, de casa para o trabalho, vão buscar as filhas à cresce, fazem jantar e ajudam os filhos nos deveres. Tema do jantar é os remédios xpto, a doente H, ou a morte Y. Não aguentam e têm de levar toda a rotina e o dia-a-dia para a mesa do jantar.
Gostava de lhes poder transmitir serenidade e a paz de espirito.
Paz que só um velho, como eu, com destino traçado pode transmitir a alguém.
Eu gostava, mas não consegui. Morri há 5 minutos. Era o paciente do quarto nr. 35.